Premissas do Ensino Híbrido

 Por Roberto Marques Silva



De forma geral, antes da pandemia, tínhamos o processo de ensino-aprendizagem calcado em atividades educativas na escola e complementadas por atividades em casa, sendo essas, predominantemente offline, com a utilização dos livros didáticos, cadernos e algumas interações online. 


Com a pandemia e a adoção do ensino remoto emergencial (Atividades Não Presenciais -  ANP), o espaço principal do fazer pedagógico tornou-se a casa dos estudantes. Esse ambiente passou a ser tanto o local de interação com os docentes e os colegas, como o local de complementação dos estudos e (e)laboração individual. Em suma, a casa do estudante hoje é o lugar predominante de instrução online e offline e os estudos, basicamente, ficaram divididos em momentos síncronos e assíncronos.


Devemos admitir que o que estamos fazendo nas ANP não é Educação a Distância (EAD), isso porque a EAD deve ser entendida como uma modalidade de ensino e, como tal, apresenta uma série de características diferenciadas das propostas para as ANP. Em especial, cito o fato de que na EAD temos, de forma majoritária, aulas gravadas e interação indireta com o professor formador, mediadas pelo professor tutor.    


É interessante analisarmos também, que os modelos sustentados de Ensino Híbrido (BACICH, TANZI NETO, TREVISANI, 2015), de modo geral, não foram projetados com essa configuração geográfica das ANP (de casa para casa). O que temos no EH, novamente, em linhas gerais,  são modelos centrados nas atividades desenvolvidas na escola, com ou sem uso de recursos das Novas Tecnologias Digitais de Informação e Comunicação (NTDIC) e em atividades, pré ou pós-estabelecidas, para serem desenvolvidas em casa (MORAN, 2015). 


Portanto, os modelos mais conhecidos, tanto de EAD como de Ensino Híbrido, não são adequados para responder totalmente e prontamente às questões desse período de ensino remoto emergencial, abrindo espaço para construção de alternativas pedagógicas que correspondam às necessidades do contexto da pandemia.


O que temos visto com a adoção das ANP no IFNMG é que é possível e necessário adaptar nossas estratégias pedagógicas, utilizando práticas já consagradas na EAD e no EH, com as devidas correções para o momento de isolamento e educação remota emergencial e  isso tem sido feito com grande competência por nossos docentes. Considero que essa lição é extremamente importante para discutirmos como será o ensino “pós-pandemia”.


Visando minimizar a insegurança de estarmos no caminho certo em relação às estratégias educacionais que desejamos implementar, agora e no pós-pandemia, gostaria de propor aqui uma reflexão sobre algumas premissas que nos servirão de alicerce para desenvolvimento dessas práticas inovadoras, nos permitindo fazer com maior segurança as adaptações dos conceitos e modelos e práticas de EH e EAD, já amplamente difundidos no contexto educacional e bem sintetizados nos textos anteriores deste blog:

Quais seriam, então, essas premissas?

Vamos começar olhando para trás. 

Em 2017, a PROEN emitiu a INSTRUÇÃO NORMATIVA IFNMG Nº 01/2017 que visava esclarecer questões relativas ao uso de carga horária EAD em cursos presenciais. Chamo atenção para o artigo quarto desta instrução normativa.

   

Art. 4º A oferta de componentes curriculares na modalidade de educação a distância ou semipresencial se justifica em razão de: I – Permitir ao discente vivenciar uma modalidade virtual que desenvolva a disciplina, a organização e a autonomia de aprendizagem. II – Flexibilizar os horários para estudos. III – Promover a integração entre os cursos e/ou campi para oferta de componentes curriculares comuns. IV – Possibilitar aos docentes novas experiências, desenvolvimento de habilidades e técnicas de aprendizagem. V – Incluir métodos e práticas de ensino-aprendizagem que incorporem o uso integrado de tecnologias de informação e comunicação para a realização de objetivos pedagógicos. 


Percebe-se claramente, nesta proposta, principalmente nos incisos I, II e V, que, ao se justificar o uso da EAD, deve-se manter o foco no desenvolvimento dos discentes.

Portanto, a primeira premissa que gostaria de abordar é a preocupação com aprendizagem propriamente dita. As práticas educativas propostas devem ser pensadas com foco no desenvolvimento do discente, suas vivências, seu ritmo de estudos e suas aptidões, levando em consideração que cada geração se relaciona de forma diferenciada no uso das NTDIC’s. 


Outras premissas são, a meu ver, emanadas dessa primeira, como segue:  

Reconfiguração do espaço da sala de aula: O espaço da sala de aula deve ser repensado e adaptado para atender propostas diferenciadas, tais como as de rotação por estações de aprendizagem (BACICH, TANZI NETO, TREVISANI, 2015).

Na verdade, o que se torna cada vez mais urgente é a ressignificação de tempos e espaços escolares, já propalada de longa data e tão necessários numa proposta de educação inovadora.

Autonomia do estudante: É preponderante que nossas propostas de atividades estimulem o desenvolvimento da autonomia dos estudantes. Este ponto vai ao encontro de processos de desenvolvimento do protagonismo estudantil, pelos quais o discente deixa de receber os conteúdos de forma passiva e atua autonomamente, na construção de um conhecimento que, via de regra, lhe é muito mais significativo, facilitando a assimilação e a fixação.

Vale ressaltar que, considerar o estudante como sujeito autônomo e protagonista do seu próprio processo de ensino, de modo geral, faz a relação professor-aluno se tornar mais horizontal, o que favorece o estabelecimento de vínculos e o engajamento de ambos no processo.   

Personalização do ensino: Com o uso das tecnologias, podemos realizar, de forma mais eficiente, a coleta de dados sobre o processo de assimilação de conteúdos, por parte dos nossos discentes, averiguando como eles respondem a cada etapa do processo e, a partir desses dados, personificar as próximas etapas, levando em consideração os objetivos já alcançados por cada um e as lacunas ainda existentes. 

Diversificação de estratégias: Três estações são construídas para que o discente atinja um objetivo de aprendizagem. Essas três estações poderiam abordar o tópico de três formas diferenciadas, pois o aluno pode começar por qualquer uma das estações. Cabe ao docente, portanto, pensar como atingir a concretização do processo de três formas diferentes, independentes, mas complementares.

Isso pode ser feito, levando em consideração os diferentes modos de se relacionar com o conhecimento.

Como consequência destas primeiras premissas, devemos considerar também o maior tempo de “mão na massa”, tanto por parte do docente, que deve pensar e preparar o processo como um todo e não de forma fragmentada, como por parte do discente, que deve percorrer as trilhas de aprendizagem propostas. Nessa perspectiva, o tempo dedicado ao processo de ensinar e aprender será substancialmente aumentado. 

 

Finalmente, temos que reconhecer que as premissas apresentadas estão postas na perspectiva da adoção de um modelo de Ensino Híbrido. Vale ressaltar que o EH não é uma modalidade de ensino, mas uma concepção de educação que busca espaços diversos e a personalização da educação a partir do currículo flexível

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Percebe-se claramente, a necessidade de um amplo debate a respeito dessas premissas e tantas outras que devem ser levantadas. O convite do GEPPE é que nos debrucemos em atividades de estudo, capacitação, experimentação e aperfeiçoamento, para forjar, a muitas mãos, uma educação pública de qualidade como sempre,  e adaptada às novas realidades como nunca. 


Referências


BACICH, L.; TANZI NETO, A.; TREVISANI, F. M. Ensino Híbrido – personalização e tecnologia na educação. Porto Alegre: Penso, 2015. p.74-85 e 265-276.


MORAN, J. Educação Híbrida – um conceito-chave para a educação, hoje. In.: BACICH, L.; TANZI NETO, A.; TREVISANI, F. M. Ensino Híbrido – personalização e tecnologia na educação. Porto Alegre: Penso, 2015. p.27-46.






    



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